
Cartilha para orientar e coibir comportamentos abusivos vem sendo desenvolvida pela Anacef desde antes das denúncias contra Pedro Guimarães, ex-presidente da Caixa.
No último dia 26 de junho, tornaram-se públicas as denúncias de assédio sexual por parte do então Presidente da Caixa Econômica Federal (CEF), Pedro Guimarães. Bastaram poucas horas para que denúncias de assédio moral também fossem direcionadas ao gestor. A Associação Nacional dos Avaliadores de Penhor (Anacef) se une às demais entidades representativas dos empregados em campanha contra a prática, que se tornou um legado da gestão de Pedro Guimarães na Caixa.
Para prevenir que novos casos de assédio – seja de cunho sexual ou moral – ocorram com os funcionários do banco, sobretudo aos Avaliadores de Penhor, a Associação trabalha na elaboração de uma cartilha de orientação sobre o assunto. O documento irá auxiliar os trabalhadores a identificarem episódios dessa natureza e solicitarem apoio, além de orientar sobre como realizar denúncias antes que os episódios se agravem. O lançamento do material está previsto para agosto e será distribuído de forma online e física para os avaliadores.
“Nossa intenção é criar uma ferramenta educativa, de orientação e acolhimento para os Avaliadores de Penhor. Por isso, pretendemos disponibilizar a cartilha também em formato físico, não apenas online, para que esteja visível a todos e ao alcance das mãos. Acreditamos que dessa forma os abusadores ficarão inibidos de praticar comportamentos opressores. Além disso, o funcionário terá subsídios para combater e se proteger de retaliações”, afirma João Carlos Pereira Ramalho, vice-presidente da Anacef.
Como combater o assédio moral
“Geralmente os abusadores pegam pessoas já fragilizadas”, comenta a Avaliadora de Penhor, Cinara Barbalho Assênsio, suplente da presidência da Anacef, que acompanhou um caso de assédio moral coletivo na agência em que trabalha. Assênsio alerta ainda que os abusadores tendem a culpabilizar a vítima por seus comportamentos, sobretudo em casos de assédio moral em que atitudes autoritárias seriam motivadas pelo baixo desempenho dos profissionais.
Foi o que aconteceu na agência em que a avaliadora atua. O gerente geral designado para aquela unidade destitui os poderes dos demais gestores (gerentes de setor) e todos os fluxos, aprovações e demandas deveriam passar pelo seu aval. Com isso, a equipe passou a se sentir reprimida. “Ele testava os limites de todos. Chegou a receber respostas ‘atravessadas’ de colegas que resistiam às provocações. Por isso, ele continuava pegando pesado com os mais vulneráveis”, relata Assênsio. Segundo ela, colegas estavam prestes a ter crises de ansiedade em decorrência do clima de tensão.
Após perceber os indícios de abuso moral e ser procurada por colegas denunciando as atitudes assediadoras, Cinara Assênsio registrou por escrito e por foto os detalhes dos eventos abusivos. “Certa vez ele ameaçou que se não limpássemos a célula em cinco minutos, jogaria tudo fora. Depois de alguns minutos ele voltou e colocou inclusive documentos importantes do banco em sacos de lixo”, comentou. A avaliadora, que também é delegada sindical, conta que nesses casos, é preciso registrar e acumular provas para consolidar a denúncia, caso contrário, sem fatos evidentes, a queixa pode ficar incipiente e levantar a possibilidade de represália contra os funcionários.
Depois de orientar a equipe a monitorar o comportamento do gestor, a Avaliadora deparou-se com o que seria o estopim para a punição do abusador. O gestor ignorou o protocolo sanitário determinado pela Caixa. Isso porque, além de não usar máscara corretamente – mesmo sendo notificado pelos colegas – o gerente geral ignorou procedimentos importantes para combater a contaminação por Covid-19 na agência.
“Após um colega testar positivo, enviei uma mensagem privada para o gestor falando sobre a urgência de notificar a equipe e acionar o protocolo. No mesmo dia, mais tarde, fiz o teste após apresentar sintomas gripais e também testei positivo. Então, informei a equipe, mesmo assim, o protocolo não foi acionado até o dia seguinte, às 9h30min, quando a SEV [Superintendência Executiva de Varejo] ligou para agência e ordenou o fechamento após a denúncia. Vários colegas já haviam chegado para trabalhar na agência naquele dia e tiveram que retornar para casa. Foram expostos”, comenta a avaliadora.
O caso foi denunciado para o sindicato e repassado para (SEV), e só então o gerente geral foi notificado por seus atos e rebaixado. “Ele acabou sendo enviado para outra agência, nosso problema acabou. O que nos preocupa é que ele é o problema de outros trabalhadores agora”, desabafa Assênsio.
Tais ocorrências reforçam a necessidade de projetos educativos voltados à prevenção e combate efetivo a todo tipo de assédio, seja moral ou sexual, além de um sistema de punição rigoroso para os assediadores.
Como denunciar
A Caixa mantém um canal para denúncias onde também há orientações sobre os tipos de assédio e como identificar situações dessa natureza. O Contato Seguro é um canal externo onde o funcionário denunciante é acolhido por psicólogos e o atendimento é humanizado.
Também é possível buscar apoio com os delegados sindicais que atuam nas agências da Caixa, com os sindicatos de classe, e Associações, como a Anacef.
Nova presidente da Caixa promete combater abusos
Após a demissão de Pedro Guimarães da Presidência da Caixa, o nome de Daniella Marques foi anunciado para substituí-lo. Conforme apurou a jornalista Andreia Sadi, no portal G1, a nova presidente já teria solicitado à diretoria jurídica da Caixa documentos para analisar quais serão as primeiras mudanças que tomará em relação aos casos de assédio assim que assumir o comando do banco.
Ramalho, vice-presidente da Anacef, mantém boas expectativas quanto à atuação da nova presidente em relação ao combate de comportamentos abusivos. “Nossa expectativa é sobre a eliminação de qualquer tipo de assédio”, comenta.
Para a presidente da Anacef, Michele Venzo, a cultura do assédio que se instalou na empresa só poderá ser revertida através de união e conscientização: “Não podemos deixar que os eventos ocorridos na gestão anterior sejam simplesmente esquecidos e jogados para debaixo do tapete. É hora de apurar as denúncias com rigor e acabar de vez com a gestão pelo medo que tem permeado as relações profissionais na Caixa nos últimos anos.”
Daniella Marques tomará posse como presidente da Caixa Econômica Federal nesta terça-feira (5) em Brasília, mesmo dia em que bancários e bancárias realizam atos contra o assédio moral e sexual em todo o país.
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